terça-feira, 24 de abril de 2012

SURTO



                        Para Thais


quando não se tem nada
todo pouco basta
e
todo vago é fundo.


todo canto esbarra
no limite do nada
e
todo mundo é surdo


toda noite é triste
só, e negra como o surto
e
nada mais há no absurdo


todo pranto é nulo
universo raso-fundo
e
amar não é tão imundo



quando não se tem nada
todo pouco basta
e
todo vago é fundo.

ora,
vejam
tenho aqui
um poema
esplêndido

nulo como os dias
fétido como as certezas
forte como as rezas

corram
que a poesia
está em liquidação
líquida ação
pelos ralos
da vida.

ora,
vejam
tenho aqui
novíssimo
um poema
esplendido

que não toca coisa alguma
nem desperta amor ou ira.

A PRESA LOUCA



            para uma sintomatologia de nossa culpa
                               (sobre um poema de Lia Carneiro Silveira)


[ela]
bate portas que a aprisiona a vida,
[suas dignidades]

resiste a vestir roupas beges
[que a condena a ser bicho]

fala aos berros que é dona do mundo
[o desejo de todos ali]

inundou o seu mundo restrito
[por saudade da praia!]

é medica, artista, rei, homem-mulher
[e só pegou uma bicicleta!]


[eles]
            a trancafiaram
            a endoideceram
            a deixaram sem colchão
            sem banho e sem pão
            sem esperança e consolação

[só por ela ser]
o espelho de nós sem razão
a coragem do desejo de nossa frustração
a resistência a esse mundo de cão


            deram-lhe DIAZEPAN
            ofereço-lhe DIAZEPÃO.