sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

OS ANOS. AS ONDAS

31 de dezembro de 2010
(Thiago Luis)





   

 
sinto o fim do ano como as ondas no cais. indefinidamente infindáveis e, no entanto movidas por alguma intensidade de renovação. as ondas. erguem-se imponentes como se se quisessem consumir as areias da praia, vento, marés, luas e, no entanto, caem rendidas ao encanto de si mesmas, ofertando espuma, bruma, encanto e beleza. e uma esperança sempre atual. virtual. real de vir outra. o movimento que jamais cessa. das ondas. finda-se o ano, regue-se outro querendo nos consumir e, rendido, rendemos ao seu encanto de esperanças e beleza. não é a toa que quem governa as águas e as ondas é yemanjá. esse é o mistério de yemanjá que só os negros conheciam e que o brasil tardou entender, mas sempre compreendeu. renovação, velocidades cambiadas de esperanças que, mesmo que tendam a nos dominar - areia que somos neste imenso infinito -, desfraldam em encanto e beleza. movimento brasileiro por excelência. tropical. devires sempre possíveis que se germinam no íntimo do caos. flores que brotam. ondas que se elevam. risos que escapam. lares que se constroem. palafitas. e as ondas continuam a fazer espuma, brumas. os pobres continuam a fazer filhos. lares em exasperação e paz. as ondas continuam a se elevarem e levarem meu pranto. um ano termina e outra onda se faz.

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

eu não acredito


na vida em branco e preto



só se é feliz mesmo

em tons pastéis.

 

ARREPENDIMENTO

o arrependimento
é o golpe
que damos em nós mesmos

enquanto aguardamos
a próxima
cilada

depois tomamos o bonde certo
mas aí já é o fim
da estrada.

(29.12.2010)

SURTO

(sobre o surto de um grande amigo)
         


deuses confusos
segredos ocultos
e uma exatidão em seus olhos
azuis
de pus



mares sem cais
brumas de caiscais
céu de new orleans
e rio



mito ao escuro
medos do absurdo
e o incesto onírico de repente
reluz
me pus





sampa com seus gays
nos games somos reis
e a paulista salvadora
nina


uma emoção diferentemente
introduz

alegrias demais
súplica aos pais
sêmen de rapaz
e um surto.

   

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

 


Quanto mais me conheço, mais te desconheço
Quanto mais te conheço, mais me desconheço
Quanto mais te desconheço, mais me conheço
Quanto mais me desconheço, mais te conheço

Nossos caminhos devem estar cruzados mesmo,

Descruzamo-nos ou desnudamo-nos?

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Se toda
convicção
tece os dramas
da razão

DES-CON-FIE

só a emoção
aquece
a malha do coração.

domingo, 26 de dezembro de 2010

CONTRA INDICAÇÃO

Esta poesia
Está contra indicada
Para pacientes
Com hipersensibilidade
Conhecida a esta droga,
Ou com sensibilidade nenhuma.
Em pacientes portadores
De conformismo
Com o mundo, com seus espelhos
Com a poesia.
Não pode ser usada em pacientes
que não vêem a beleza dos céus
e para aqueles que acham
que a parabólica é somente
uma antena de televisão

não façam uso!

MINHA POESIA ESTÁ DE LUTO

Minha poesia está de luto!

De luto pelos que morreram
Sem estarem vivos
E, pelos que vivos, não podem morrer.

Pelos 11 de setembros de todos os tempos,
USAfeganistãos, mortos do sertão
De fome, de sede, de letra e amor
E pelos “nãos” aos meninos de rua

Minha poesia está de luto pela morte da lua
Sondas estelares como supositórios me doer
Pelas crianças que nas ruas não podem mais correr
Gentileza que se foi e-nu-brecer outras plagas

Quero uma poesia militante, humilhante, delirante
Futurista do original da tradição
No aqui-agora-do-impossivel-do-instante-do-chão
Sem métrica, rima ou beleza,
só alguma delicadeza!

Minha poesia está de luto
Carrega no braço esquerdo uma faixa preta
Mas na mão direita, folha e caneta
E vai,
Descendo o morro, sambando
Cheia de delicadeza

31.10.2007



Não.


Não quero ler.

Vão para os infernos

As revistas, os livros, as manchetes.

Quero ficar só

Com minha solidão

Só comigo.

Longe do mundo dos negócios

Dos carros

Dos barulhos.

Ah,

Como me infernizam os barulhos.

É pipoqueiro

Carro de som

Cantiga de gás

Chiado de filé mignon

É axé tocando

Misturado com sertanejo

A voz da vizinha chata

É o pipoqueiro

Polícia que passa

Anúncio da lojinha nova

As Casas Pernambucanas

Ou as Americanas

Anúncio de promoção

Cama mesa e banho

E eu quero só um instante

De silêncio

Não quero ler hoje

Nem quero sair

Apaguem as luzes

Das cidades, dos faróis, dos carros

As lamparinas

Desliguem os motores das motos

Dos caminhões, das fábricas

Tirem a voz da fofoqueira

Façam silêncio

Para não acordar o amanhã.
Campestre
Campado
Campo
Com pó


Toda linguagem é narcótica!

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

DESESCRAVIZADO (para uma poesia esquizoanalista)



Na pretensa lógica de ser eu
já sou muita gente
e, mesmo que eu me contente
com o que penso que sou,
algo me esbarra
e, fragmentado
unimultifacetado
estendido no chão, sou fóssil
socius
sou máquina.


Dentre tantos de mim
que em mim me fala
eu ouço

e grito
e gritando mo silêncio dos pulsos
escorro
e escorre-me outra luz
que me desescravisa
e, desescravisado de mim mesmo
sou outro

Só a esquizofrenia salva!

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

EU ACREDITO

[...] Mas somos muito milhões de homens

comuns

e podemos formar uma muralha

com nossos corpos de sonho e margaridas.

Ferreira Gullar







Eu, sinceramente

não acredito!

não acredito em instituições

constituições
abolições



Eu não acredito

em panfletagens que hipnotizam
no marketing que aprisiona vidas
em rezas, santos e humanidades



Eu acredito na fome

que esconde debaixo da roupa o macarrão
na falta de educação
... e na dor no estômago!



Eu acredito no palavrão

mandando para a puta que pariu
um dia a mais que surgiu... e toda a dor,
a mãe pinguça vista no educador!


Sinceramente,
não acredito em salvação
sem que antes seja dado o pão,
a mão
o não,
o anel , que seja,
... e um lugar à ceia dos bons...



Eu não acredito nem

no Cristo pregado na cruz
mas segurando a mão do moleque assaltante
pr´ele levar só o dinheiro e não jogar avante
alguns restos de sonhos de realidades... e o sorriso!



Eu acredito na mentira

contada a custas de ser visto, acolhido
quiçá agredido, mas mesmo assim visto
eu acredito no não-dito, só isso!



Eu acredito em pichações

nos drogaditos pedindo um seio,
nas balas compradas a esmo
ao sabor do medo
... e lançadas na próxima esquina...

com o mesmo esmo,
com o mesmo medo...



Eu só acredito

no olhar dessas crianças!











quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

EDUCAÇÃO SOCIAL

... para uma (pro)esia social-comunitária



Ela, pequenina, chegou com a cabeça cheia de piolhos.
Eu com confusões e ela com piolhos.
Ambos nos corroendo.
Andavam livremente em sua testa,
parque de diversões que eram,
pareciam nos olhar
fixamente, por um instante
e, depois continuar a brincar, os piolhos.

Ela, pequenina, também parecia nos olhar.
Olhava
fixamente, por um instante.
Desconcertante olhar.

Outras crianças também percebiam o olhar
dela, pequenina, e do piolho.
Mais dois segundo e o olhar destes virariam chacota
para ela chorar.
E os piolhos já dançavam em sua testa!

Ai meu Deus.... (pensar)

Súbito fingi pegar o piolho,
(Fingi)
Para lhe assustar, esparramar os cabelos para ele
parar de corroer a pequenina,
para minhas confusões pararem de me corroerem
para as crianças correrem...

Mas ele estava (ilusoriamente) na minha mão.
Que fazer?
Deus de novo (e pensamentos)
Num átimo, levo-o à boca e finjo comê-lo

___ Aaaaaahhhhhhhhh - diziam as crianças piolhentas -
Você come piolho?
___ Pois que não... um doce só que é, é bom.... come não? Igual Içá!
___ Eu não. Aaahhhhhhhh!!!!

Ufa
Elas correram!

...

Três horas depois, de tanto correr...
a pequenina, com um piolho entre os dedos, feliz:
___ Tio, Tio, trouxe um que achei aqui, para você comer!


2-12-10




céleres passos
no fim da escada.
___quem és que me ignora
o medo de tê-la na distância do olhar,
ao cheiro do teu respirar
na distância da boca, do beijar?
__ quem sobre as escadarias do meu ser
e que, no meu entardecer
estremece?



definitivamente não te conheço!




não te conheceria as mãos tão nazarenas
tão estrangeira familiar
feito um poema de gullar
à nossas crianças afagar...



e continuas a subir as escadas
de mim
e, se há algum fim
diante dela, algo mais me faz tremer
___ vou ver-te quando acordar?
___ vais chegar?



e pulso, pulso, pulso, pulso



meu coração arrebenta como
onda do mar
inferno de tempo passar num átimo!
e eu a olhar...
perto de ti o tempo parece perder-se
e eu pareço perder tempo
perder-te ao tempo
resta-me o arrependimento
gal cantando um lamento
e uma brisa


aos degraus finais páras, respiras
suavissimamente
e, suspiradamente olha para mim com tua luz
ri, de canto de olho




...já não mais estou...
arrebatado que sou de teu olhar....
noite de 2-12-2010