sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

CARTA DE APRESENTAÇÃO

Em memória de Carlos Drummond de Andrade, Deleuze/Guattari,
 Regina, Gisberta, Chico Buarque, Dilma Russeff, Paulinho da Viola,
Tom Zé, Lígia Clark, José, Maria, Gonzaguinha, Pedro,
Ana, Rita, Joana, Paulo, Francisco, Iracema...




I
apresento-te um condenado.
um condenado a ser piegas.
afinal, porque todo amor tem de ser
piegas?
tem de ser um escafandro
          de bem quereres
banhado pela aura prateada da lua?
por quê?
apresento-te um piegas.






II
apresento-te um vagabundo.
desses que emprestam dinheiro da amada
e quando o amor acaba
não a paga
para ela lembrar de si.
afinal,
uma pitada de raiva e uma sensação de ingratidão
são das mais boas lembranças de um
                    amor.
“que deus me livre dos vagabundos”


        





III
apresento-te um poeta
não desses drummond´s, camões...
                     que fazem versos
como se fossem filhos do infinito
não.
apresento-te só um pobre coitado
sambista que empresta a rima
às noites pobres, quentes, quase infernais.
quem empresta as rimas aos pernilongos a
            azumzear
no ouvidos das gentes.
desses que não chega à academias nunca
por querer devanear nos poemas
o peso das construções.
“prumo e métrica – deixemo-los para as construções!”
apresento-te um pedreiro!

   





IV
apresento-te um brasileiro
falando errado, escrevendo mal
errando nas concordâncias verbais.
“mas ora, vejam,
pra que acertar nas concordâncias verbais
                                            dos textos
se me entendo numa conversa com meu
compadre: concordância verbal!”
afinal,
criar filho é ter inteligência,
levantar cedo é ter saúde,
fazer patuá é ter deus no coração.
só o que basta:
“e eu vou lá querer saber de concordância verbal?”


  





V
apresento-te uma mãe
não dessas que têm babás
mas as “bobas”, que todos apontam
nas filas das penitenciárias.
que têm os bolos virados farofa
e a dignidade fitada de cócoras.
uma mãe
       - e mãe é sempre mãe -
com babás, ou com bolos, bobas
acordando de noite para cobrir os filhinhos
nas manjedouras
       - mãe é sempre mãe -,
arreganhada ao peso dos vértices
dos sonhos dos filhos, e, sorrindo.
apresento-te uma mãe.






VI
apresento-te uma moça,
ou um moço, se a lei preferir
dessas que nas esquinas, têm seios fartos
                              e peruca loira
que têm coragem de burlar os
enunciados castradores do desejo
do devir além da reprodução
e ser cidadão, sendo a-cidadão
ah,
se lhes jogassem flores ao invés de pedras
os senhores casados que lhes pagam seus serviços
na calada das noites;
ah, se lhe jogassem flores
poderiam construir tantos enormes jardins.
apresento-te uns travestis.










..........
piegas, vagabundo, poeta, brasileiro, mãe e travesti.
           apresento-te um ser humano!

3 comentários:

  1. Thiago, não sei o que lhe dizer... O meu amor pela sua poética já está dita, porém, este poema é d+... Me fez chorar, pulsar, vibrar e me indignar.
    Só queria , neste momento lhe abraçar e dizer: obrigado!...
    Axé, Olurum...Allá...
    Só os céus podem lhe explicar.
    Abraços. Jorge

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  2. Caro Jorge, seu carinho é mesmo um abraço... Eu que agradeço por este bom encontro! Axé!

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  3. José Valdez de Castro Moura11 de fevereiro de 2011 às 22:13

    Thiago, o Poema já nos desvela o ser que se inquieta , que se assombra ( um ato filosófico !)ante as mazelas que se abatem sobre o Homem , imagem e semelhança de Deus.Agradeço aos céus a sua existência, a sua voz pelos que não têm vez.Compartilho os mesmos sentimentos do Jorge Bichuetti, também Poeta dos bons.Luz e Paz !

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