domingo, 5 de agosto de 2012

BURACOS



A sombra do que falta

assombra o que sobra

no negativo ser da gente.




Só há corpos e vazios

lágrimas e risos invasivos


perpassando-nos.



Só buracos em volta!



domingo, 10 de junho de 2012

POEMAS


I
Coça, coça rente
no profundo do ser da gente
uma saudadinha imensa
maior que o tempo do mundo
menor que o espaço do fundo.
Coça, coça
Quanto mais se coça
Mais se sente
Tão rente.



II

O amor é algo mexemexendo no meio do mato da gente




III

eu, que sofro tanto
por amores
                resolvi mudar!
à partir de hoje
eu só vou sofrer
por amares.





confunde-se-me
e beija-me-se
confunde-se-me mais
e afundo-me-se

                [total me entrego
                total se intriga]

confundo-me-se
e beija-se-me
confundo-se-me mais
e funde-se-me

você
sonha por aí
com outro - outros caminhos
nos interstícios de sua ilusão
amarga.
e
cá,
eu,
sozinho
lhe
esperando
outros caminhos:
a lhe inundar a vida
a lhe ensinar uns truques
a lhe construir uns motes

[mas sou granito e pão
enquanto o mundo é sonho e som]

perco,
fácil.
mas
espero
um
beijo
assim
mesmo
sem
língua
nem
paixão.

espero,
                que a vida é feita de granito e som.




                                      

quando lhe vi
não achei que fosse tão real
flor miúda de sons e tons
vida (algo) em descomunal.
mas havia algum mistério
algum roteiro escondido
alguma luz, alguma paz
beleza de caos em cais
lindeza sem igual.

quando lhe ouvi
desmontou-me meus castelos
arruinou-me minhas ruínas
- minhas sérias banalidades -
e uma lágrima se esvaiu no chão
                               chuva e som
feito Cranberries e Tom
borboletas-querubins em contemplação

quando lhe beijei
tudo mudou
seu beijo quero-não-quero
de bem-mal-me-quer-bem
me exasperou
sou tímido poeta longe das festas
que se encanta por uma luz em fresta
                vidas ao entardecer

tenho medo demais de me apaixonar!

UMAS SAUDADES

                            soneto inacabado para meu pai, Carla Guerra, Juliana Ciciliatti e Valdez!


Andam me brotando umas saudades
tropegas, como as palavras sem canção
inundando-me feito faze sua oração
trazendo-me às vistas minhas calamidades.

Saudade de ler poemas e rir deles, com ardor
de cantarolá-los ao som de sopros, ventanias
de tomar café em outras cercanias,
e inventar uma nova palavra ao invés de amor.

Saudade da noite, do barulho-som dos silêncios
das trovas artesanais, retalhos de momentos
risos de cantos de olhos de meu algum  lamento.

Saudade mata sim... ferida funda que se sente
que arranha a pele árida de pedra da gente
brotando no fundo escuro de se ser: lágrima-semente!

terça-feira, 24 de abril de 2012

SURTO



                        Para Thais


quando não se tem nada
todo pouco basta
e
todo vago é fundo.


todo canto esbarra
no limite do nada
e
todo mundo é surdo


toda noite é triste
só, e negra como o surto
e
nada mais há no absurdo


todo pranto é nulo
universo raso-fundo
e
amar não é tão imundo



quando não se tem nada
todo pouco basta
e
todo vago é fundo.

ora,
vejam
tenho aqui
um poema
esplêndido

nulo como os dias
fétido como as certezas
forte como as rezas

corram
que a poesia
está em liquidação
líquida ação
pelos ralos
da vida.

ora,
vejam
tenho aqui
novíssimo
um poema
esplendido

que não toca coisa alguma
nem desperta amor ou ira.

A PRESA LOUCA



            para uma sintomatologia de nossa culpa
                               (sobre um poema de Lia Carneiro Silveira)


[ela]
bate portas que a aprisiona a vida,
[suas dignidades]

resiste a vestir roupas beges
[que a condena a ser bicho]

fala aos berros que é dona do mundo
[o desejo de todos ali]

inundou o seu mundo restrito
[por saudade da praia!]

é medica, artista, rei, homem-mulher
[e só pegou uma bicicleta!]


[eles]
            a trancafiaram
            a endoideceram
            a deixaram sem colchão
            sem banho e sem pão
            sem esperança e consolação

[só por ela ser]
o espelho de nós sem razão
a coragem do desejo de nossa frustração
a resistência a esse mundo de cão


            deram-lhe DIAZEPAN
            ofereço-lhe DIAZEPÃO.



segunda-feira, 19 de março de 2012

INSCRIÇÃO

Eu queria lhe banhar de poesia
De águas puras, do mar sem fim de mim
Molhar seus olhos com minhas alegrias
E não secá-los jamais, para que nunca tenham fim.

Lavar seus pés co'as lembranças mais queridas
Pra que só andasse só onde eu estou
E as águas que escorressem em seu rosto, quando caídas
Formasse o espelho de onde me virei quem sou.

Eu queria banhar seus seios com os meus sonhos
P'ra que jamais fossem desfeitos ou esquecidos
E no seu colo eu me deitar em versos livres.

Eu queria lhe banhar de poesia
P'ra de felicidade e paz eu afogá-la
P'ra eu inscrevê-la permanentemente em minha vida.

domingo, 4 de março de 2012

POEMA SOBRE UMA BELEZA AÍ


como flor silvestre em tímida beleza arrasadora, eu não lhe conheço. seus cabelos negros e olhos de desconfiança de criança é paz. por trás de tudo que é, só cais. cais e caos. sua música me encanta ó borboleta-querubim. e sua doçura me adoça. quisera eu amá-la o mais que possa. tocá-la a mais bela bossa. mais humano. seu respeito ao outro e ao mundo. toca esse meu imenso tão profundo. no meio do mar. ilha. se há muito caos aí dentro, digladiando com sua beleza, és mar.. ondas grandes tempestuosas e um universo todo dentro a me arrebatar. gosto de seu caos e sua paz, sua música e seu silêncio que jaz em algum escuro. eu sou a ilha a lhe esperar a onda, a atrapalhar o sono. não há ilha sem mar, tem tampouco mar sem ilha. tudo é mar-ilha. e o meu encanto.


INFECÇÃO AURICULAR

hoje estou a tapar meus ouvidos
infecciosos
e o algodão suave como a bruma
aumenta minha exasperação

ouço intenso o barulho dos meus ares
e todas as partes
do dentro de mim
bailam e se batem, e caem estranhas
como um balé moderno

[só ao som da respiração]

o barulho do dentro da gente
é de encanto assustador

amortiza e faz sonhar

feito o amor, o riso e a dor.
feito a morte com seu explendor
como o dia
sua alegria

no repente do susto algo pára:
não para os aplausos do espetáculo
de um publico só, só-eu-público.
e as sensações, medo, riso e sonhos
que se atracavam em um mar risonho
não congelam como os bailarinos
                do balé moderno

eles vibram indissoluvelmente neste
corpo-sem-órgãos de todo-ninguém
questionando: proncovô,
                nesse sol irritante?




(Grupo O Corpo, 2005)

ALARME FALSO

corram, venham logo.
chamem os bombeiros,
a polícia militar
o pastor.
divulguem na televisão.

disfarcem todo mal, estanque a dor
desvirem o selo da blusa
e corram
[mas corram com algum pudor]

não percam tempo.
ande,
depressa!.... tragam máquinas fotográficas
chamem a imprensa aberta, a banda imperial
com pressa!

virem no santo,
façam festa:
são joão, caboclinhos, moçambique e rezas.
e gritem...

andem, não demorem....

...

____ desculpem!
podem voltar.
era alarme falso
o amor.

(RE)SENTIR-(SE)

                                 (sobre um conto de Onjaki)


inexoravelmente acordo
com o solavanco infrêmito de forças extremas
               sobre mim.
e o odor...
o odor civilizado grotesco
perfume-suor-cigarro

                (seria free ou malboro?)

eu, que deitada no chão
sobre os sonhos da minha realidade,
que acordo com o susto dos dias
co’as horas infindas
da morte,
acordo no íntimo brusco da noite
com o açoite
me sufocar
arfar.

suas mãos sobre minha boca,
em meus lábios de cima e baixo
em movimentos marítimos
a me imobilizar,
intimidar.
súbito livra minha boca, já não grito
ardo.

imóvel,
no duro dos papelões do chão,
no quieto da noite
sob o mundo, ardo.
e dói.
e da dor um gemido
consubstanciado em fome e sonho
me elevo e não grito.

... e o cheiro ocre civilizado ventando em mim
sobre meu pescoço sem perfume
- que no entanto cheira -,
entrecruzam cheiros genéricos
das entranhas ferventes do instante .
misturam-se os cabelos.
suores.
no íntimo do silêncio
arrepiam pêlos
como se o próprio deus sobrevoasse
                 rasamente
sobre os campos da terra, meu corpo.

não há mais visão
só o bafo ocre civilizado sobre mim
e eu imobilizada
penetrada e entregue pela sagacidade,
pela luxúria frêmita do mundo.
haveria outros ao meu lado, companheiros de chão.
- não veriam, absortos que estavam
à própria mediocridade, à própria escuridão -.

... e os movimentos marítimos me imobilizar...

dói.
uma dor do prazer.
antes tivesse levado porrada
antes tivesse tomado cachaça,
mas não.
absorta ante a vibracidade do corpo
jazo arreganhada e evadida.
uma lágrima escorre,
cai sobre meu rosto,
contorna os territórios de mim
e, chega à beira da boca
lambo-a.
sal da terra.
já não sei se é lágrima ou suor,
minha ou dele.
- que importa?
somos um neste instante no mundo
civilizado e impuro
puro imobilizado

                e somos tantos -.

... deus continua percorrendo as terras
rasamente...

e os pêlos se levantam
sem demarcar qualquer organismo,
parte, mapa.
vaga indiferentemente sobre mim
bloco imóvel de carne ressuscitada
(in)sucitada e (ex)citada
de alguma emoção qualquer.
clamor, calor, claridade e dor.

... súbito pára.
continuo imóvel.

o desgrudar-se de mim é penoso.
suores,
cheiros,
lágrima
sangue,
a civilização se levanta

vejo-o em sombra, esguio.
eu, continuo imóvel.

escorre-me.
lágrima
suor,
sangue,
               porra
misturadamente,
e continuo vendo-o em sua sombra.
escorre-me o produto da civilização
que (con)sumo
escorre-me a lembrança do cooptar-me,
                cooptá-lo.

escorro-me.

ele corre.
pára. olha para trás.
continuo imóvel.
como que culpa ou nojo,
uma cusparada no chão em que sou.

escarro-me em vidas.

                suavemente.
re-sinto-me e viro de lado.
fecho as pernas.
acabou.

no duro do chão
no quieto da noite
sob o mundo,
já não ardo,
               só dôo.

com meus papelões
papelotes,
espero acordar-me ao susto dos dias.

SEM PALHA



alguns olhos de obaluaê
lançando pragas e curas
                                por aí
e os moleques
nos cinemas...nas baladas
postes. encruzas. cruzando.

i pods. nada podem com
esses meninos e seus sexos

olhos de suave dor. mistério
amanhã. maconha. escola
o sexo co´as meninas
co´os meninos
esse meninos andam por aí
lançando pragas e curas
aos olhos de obaluaê

por que perco tempo
na asa do vento
no sopro do mundo
nesse imenso vão tanto
um pouco fundo?

há tanta luz além do plexo
há tanta voz aquém de todo nexo

e eu aqui
solitário
longe dos poemas e das serpentes
dos amores
e das gentes

não há nexo em todo nexo
em todo plexo
em todo sexo
reconvexo

quero a sombra dos momentos
o sêmen dos pensamentos
algum carinho mudo
den´de mim calando fundo
sem nexo.

A PAIXÃO

a paixão
é um bicho estranho:
cutuca,
fere,
sangra,
             quase mata.

mas a gente escapa.

HAI-KAI-ZINHOS

I

Sumi do mundo
E me perdi de vez.



II

                   no
chão da vida
é que se encontra
o descanso, a paz.




III

[retardado]
não passa pela vida,
          repete de anos.



IV

na plenitude do tempo
penso

e,

na concretude do espaço
esqueço.



escaldo o tempo
levemente
como quem espreme um limão

e mato o tempo
ociosamente
como quem esquece
a quem virão

...
mas uma limonada não é a melhor coisa do mundo?
frígida palavra
toda palavra é frigida
          se não cantada!

eu só creio
na arte
dos fatos

artefatos
que invento.


MEU CARRO

o motor do carro
ronca ronca
ronca
no meu desejo

e morre
sem combustível


tudo é belo
tudo é lindo
quando nos toca
          desinteressadamente.


todo belo lindo
desinteresse que há
na mente

          me toca!
folhas brancas
sobre
o abismo
das horas






...





há sonhos
incrustrados



n´algum
canto escuro.



quinta-feira, 26 de janeiro de 2012


Simplesmente,
          desisti de ter razão.
Não que tenha me conformado com as injustiças,
que tenha deixado de me assombrar com as misérias
          - as misérias sociais e as da alma.
Nem que tenha me acostumado com o poder
que alguém supõe ter sobre outros.

Não.
Não me conformo.
Não me formo com as formas dos hipócritas e esdrúxulos.
Não estou com eles.

Ora, algumas pessoas, por mais loucas e doentes,
          continuam invisíveis.
Alguns problemas, por mais fáceis de solucionarem,
          continuam desprezados.
Algumas fomes, por mais emergentes e cruéis,
          continuam deixadas de lado.

Mas eu não quero ter razão.
Achar que tenho alguma razão nisso tudo.

Se não passo ao largo dos meninos nos faróis,
se não prendo a respiração quando me atravessa um mendigo
          mijado todo de nossas certezas e belezas,
e se não acho os criminosos os demônios sobre a terra,
          - não quer dizer que eu tenha razão.

Vai ver que eles estão certos mesmo.
Que vale tudo isso, se nada muda?
Que vale o sorriso para a velha preta e pobre,
a atenção para o chato de galochas,
respirar a própria putrefação que os mendigos mostram
e acreditar no sonho?

Mas não.
Eu não faço parte disso.
Eu sonho com algum azul.
Eu acredito na saúde e no trabalho,
nas decências e no baralho
na verdade de cada um.
E se me mostrarem os abismos,
os interstícios dos caminhos mais sombrios,
mesmo assim eu rezarei para não me desiludirem.

Deixem-me só, com minha ilusão.
Com a minha fome de alegrias.
Com meu egoísmo transformando-se em guias.
Com minha exasperação.

Mas eu não quero mais ter razão,
Pois enquanto brigo por razão,
alguém sente dor,
outro morre,
nasce algum amor,
ou flor.

Não,
Definitivamente, não quero ter razão.
Quero ter mais ação.
Multiplicação.
Ilusão.
Toda a imensidão.
E silencioso como renasce o dia,
          fazer um curativo, rezar uma ave-maria,
          respeitar alguém só por sua vida
          tentar aprender a amar.

Não!
Eu não quero mudar o mundo
E nem quero ser bom. Não o sou.
Só quero esperar que ele possa me mudar, um dia,
E haja mais abraços e flores pelas ruas.
Haja menos desconsideração.